quinta-feira, 21 de março de 2013

Val Marchiori é o retrato do Brasil

 
  Enquanto começo a escrever essas considerações eu escuto a vinheta de Mulheres Ricas, o programa está sendo reprisado pelo TLC.

  Mulheres Ricas é mesmo o programa superficial, sem cultura que a mídia brasileira se esforça tanto para mostrar?  Eu acredito que não.

  Finalmente a segunda temporada acabou, é muito triste. O programa é uma delícia e seria maravilhoso se a temporada fosse maior ou se o programa continuasse indefinidamente. Assistir a Mulheres Ricas é uma espécie de vingança dos brasileiros, é o total oposto da realidade do brasileiro comum e mesmo assim o retrato mais fiel do Brasil. Se nos Estados Unidos há o "American Dream" nós podemos considerar que o Mulheres Ricas é o "Brazilian Dream", um grupo de mulheres que não trabalham (claro, há exceções) e obtiveram tudo de mão beijada, seja por casamento ou seja por nascimento. A maioria delas se diz trabalhadora, mas a verdade é que se não fossem casamentos (ou uniões) multimilionárias elas raramente teriam tido a chance de construir um patrimônio do zero.

  O programa trata de mulheres (sim, elas são mais vulneráveis) esbanjando dinheiro em um cotidiano de compras, spas, viagens caríssimas, tudo exclusivo, caríssimo e nem sempre de muito bom gosto (se estivermos falando de uma determinada participante, raramente de algum bom gosto).

  Mas por que mulheres? Como já disse antes elas são mais vulneráveis, não é tão fácil assim fazer chacota de homens, se fossem homens ricos mostrando o seu cotidiano luxuoso não haveria esse apelo todo, sempre há justificativas para as extravagâncicas dos homens, mas para a sociedade as mulheres são sempre fúteis, seus trabalhos são distrações, então nada melhor do que mostrar mulheres ricas esbanjando, é o supérfluo elevado ao cubo.

  A primeira temporada foi toda muito acidental, foi uma delícia, ninguém sabia direito o que estava fazendo. Talvez só a Val soubesse, mas não tenho certeza se ela tinha conhecimento absoluto do que acabaria se tornando as coisas que ela fez. A primeira cena que realmente chamou minha atenção para o programa fi a Brunete (1ª temporada) dando chiliques porque o funcionário dela não achava a Barbie dela, ela não deixaria o coitado ir para a faculdade sem antes encontrar a boneca dela. Aquele momento foi surreal e eu me apaixonei. Amo reality shows, amo tentar entender a mente humana. Tenho dificuldade em lidar com pessoas, entender as pessoas, minha visão do mundo é um tanto científica, parecida com a do Sheldon de The Big Bang Theory (mas não um estereótipo), então reality shows para mim são um ótimo material de pesquisa e Mulheres Ricas é um material maravilhoso.

  Mulheres Ricas é a versão nacional do programa "The Real Housewives" que é sucesso total nos Estados Unidos. The Real Housewives surgiu como uma versão reality do ótimo seriado "Desperate Housewives", o The Real Housewives é uma espécie de diário de socialites americanas mostrando como seriam as verdadeiras donas-de-casa americanas, as donas-de-casa ricas, socialites. E é lógico que elas adoram esbanjar e se mostrar as mais ricas, poderosas e influentes e com isso a serie ganhou diversas versões mostrando o cotidiano de socialites de diversas cidades, indo de Orange County até New York, já perdi a conta de quantas versões existem, da última vez que contei eram seis.

  O primeiro time contou com a Narcisa Tamborideguy, que eu admirava e achava muito engraçada, mas depois do Mulheres Ricas eu não consegui mais ver graça nela, sinto pena de verdade, não acredito que ela entenda o tipo de exposição que passa, me preocupa ver uma pessoa como ela sendo explorada no Mulheres Ricas e sinceramente tenho nojo de quem ri dela.
Teve também a Bruente que é uma arquiteta/decoradora e fã da Barbie. Ela é uma fofa e trabalha de verdade, o ponto dela no programa é interpretar a viciada em procedimentos cosméticos. Aparentemente ela é da mesma idade que a Narcisa, mas aparenta ser mais velha, ela nos fez refletir sobre os padrões de beelza da mídia, ela admira tanto a Barbie que tenta ser uma Barbie, mas isso não funcionou muito bem e ela está longe de ser uma Barbie, nem tem como a Barbie é uma boneca e o padrão de beleza dela é totalmente inalcançável. Infelizmente esse é o drama de milhões de brasileiros, perseguir um padrão de beleza que jamais vai alcançar.
  A Lydia era a obcecada por segurança do primeiro programa, ela também é uma joalheira, a família toda dela é de joalheiros. Honestamente? Me dava medo quando a Lydia falava em armas, técnicas de defesa pessoal, ela tinha um brilho nos olhos que me dava arrepios. Não que ela esteja errada, mas obviamente a intenção do programa é explorar os pontos fracos de cada uma, magnificar para servir de deboche para o povo.
  A Déborah era o ponto de realidade nessa primeira edição, ela era a mulher pé-no-chão, a âncora na realidade. Acho que a segunda temporada precisava de uma Déborah.


  E é lógico, temos a: Val Marchiori. A Val provavelmente é a mulher que mais passou dificuldades na programa (ela e a Déborah, mas duas tomaram rumos totalmente diferentes). Assistindo à entrevista da Val no programa da Marília Gabriela dá pra entender o motivo dela ter se tornado quem ela se tornou. Uma menina que passava fome na infância e tinha que subir em árvore para catar a fruta se tornou alguém obcecada em melhorar de vida e ter todo o luxo que a TV e as Revistas anunciavam. Ela está errada? Essa é a mensagem que a mídia manda para todo mundo o tempo inteiro. Qual a diferença entre a Val e os brasileiros que passam dificuldade? A diferença é que ela chegou lá, ela venceu e está lá curtindo as delícias que a riqueza oferece, esfregando na cara de todo mundo e debochando de quem nasceu ou se tornou rica e não sabe desfrutar direito a riqueza.

  A Val é como eu e você poderiamos ter sido se tivessemos tudo que ela tem, ela fala por quem não tem voz. Ela debocha das ricas e sua falta de senso. O povo odeia tanto a Val porque ela tem coragem de pronunciar todas as coisinhas que a gente tem que engolir, quando a Val debocha das roupas cafonas da Cozette é como se a gente estivesse debochando das roupas cafonas e caras dos nossos chefes, enquanto a gente não tem dinheiro pra fechar o fim do mês e os ricos do nosso dia-a-dia esbanjam em futilidades nas nossas caras e a gente não tem como reagir. Mulheres Ricas é uma delícia porque tem a Val, a Val é o retrato do Brasil, um país que cresceu absurdamente, mas cujo povo continua pobre e endividado enquanto alguns se tornaram muito ricos. Ela está lá fazendo tudo o que nós gostariamos de fazer, gastando como se não houvesse amanhã e rindo daqueles que valem mais do que nós.

  O primeiro episódio dessa temporada foi a constatação de que não existe esse programa sem a Val, a Valdirene Aparecida é o "ombudsman do show." O programa virou um festival de esquetes bobas sem a Val, mas então, no segundo episódio ela aparece nos cinco minutos finais e rouba totalmente a cena. O show é todo dela e ela sabe disso, não tem pra mais ninguém. A ausência dela no primeiro episódio só serviu pra acentuar a necessidade dela no show, sem ela o show é apenas ostentação sem crítica. A Val soma é a peça mais importante do show porque ela é exatamente o que todos nós queremos ter e fala para todo mundo aquilo que está entalado na nossa garganta, nessa sociedade da disparidade social. A Val Marchiori é RYYYYYYYYYYYYYCA!!

P.s. A Narcisa não odeia a Val Marchiori porque ela é "ruim", "falsa" ou "malvada", ela odeia a Val porque ela sabe que ela é a estrela do show, sem ela o Mulheres Ricas não existe e ela não sabe lidar com a concorrência.

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